Nasci viajando, escalando, acampando, conhecendo cidades, praias e lugares maravilhosos. Todos os sábados pela manhã, meu pai e seus amigos, encontravam-se no Mercado Municipal e de lá partíamos. Escrevo partíamos pois eu era a mascote do grupo, normalmente a única criança da "equipe". Acredito que por esse motivo a minha paixão pelo mundo e pelo que ele nos reserva, tenha ficado cada vez mais apurado e desejado.
Possuo 2 amigas irmãs, hoje moram longe, mas sinto como se estivessem aqui ao lado, em cada rua, estrada ou evento, éramos 3. Em meu carro havia um kit viagem. (Roupas de frio, de calor, de piscina. maquiagem, secador de cabelos (ainda não existia a bendita chapinha), aparelho de som, caixa com fitas cassete e CDs, salto alto, botas, tênis, chinelos e perfumes. Esse era o kit básico.
O porta malas estava sempre pronto para uma nova aventura. Nós, mais ainda!
No retorno de uma das viagens, estávamos muito cansadas e resolvemos parar para dormir em uma pequena cidade do interior do Paraná. Não vou citar o nome da cidade, pois realmente não faço ideia de qual seja. Sei que rodamos e ali decidimos parar para dormir.
Depois de muitas voltas chegamos ao centro, procuramos hotéis e nada. A cidade estava praticamente vazia, sem placas luminosas, indicações de restaurantes, pizzarias e muito menos algum lugar para descansar as 3 pobres almas.
Desiludidas, resolvemos partir daquela terra inóspita, nem um jantarzinho, nem um hotelzinho e muito menos alguém na rua para dar indicação. Me senti em um set de filmagens ainda sem elenco. Um pouco antes de sairmos da cidade, ouvimos vozes animadas, uma única casa com todas as luzes acesas, mesinhas de plástico pela calçada, pessoas sentadas em frente a casa, conversa divertida, bebidas nas mãos.
Achamos a salvação. COMIDA!!!! HOTEL!!!! Não pensamos em outra opção. Percebemos olhares curiosos enquanto estacionávamos. Acreditei que três mulheres bem vestidas (embora um tanto amarrotadas), com carro da "capital", naquele lugar desconhecido, poderia mesmo gerar um certo ar de desconfiança ou espanto.
Estacionamos o carro, estranho é que conseguimos vaga quase na porta, mesmo tendo a sensação que todos os habitantes daquele planeta estavam naquela casa. Que sorte, comida, hotel e vaga para estacionar. Seria o Paraíso?
Entramos, sentamos em uma mesa na varanda e ficamos esperando o garçom. Ninguém estava jantando, era perto das nove horas (dizem que no interior as pessoas jantam mais cedo), estava torcendo para que tivesse sobrado ao menos um cachorro-quente.
Um homem de aproximadamente 35 anos se aproximou e perguntou se queríamos tomar algo. Pedi uma Coca- Cola com gelo e minhas amigas um suco. A Coca-Cola chegou. Suco, não tinha. Recebemos 3 refrigerantes gelados. (era alguma coisa "Cola", mas não era Coca) O melhor tempero é a fome,então, não reclamamos da bebida e ficamos aguardando o tão esperado cardápio.
Estava cansada demais para entrar na casa e conhecer a lanchonete. Tinha muita gente lá fora (todas olhando de canto para nós 3) e no salão principal, percebíamos ser impossível entrar, era um formigueiro humano.
Uma senhora aproximou-se e perguntou de onde conhecíamos o Beto, no ar, uma certa malícia. Falei que estávamos de passagem e alguém comentou sobre o Beto, por isso estávamos lá. Sei que a senhora não entendeu muito minha resposta e afastou-se um tanto indignada. Não me importei, eu queria o cardápio!!!!
Cinco minutos depois, mas com a sensação de que se passara uma eternidade, levantei e fui ao balcão para ver se agilizava o jantar. Minha mente só pensava em alimentar e descansar o corpo.
Passei como um risco pela porta principal e meus olhos buscaram o balcão de atendimento. Sem perceber que no centro daquela "sala" estava o Beto! Sim, o famoso Beto! Camiseta branca, calça escura, barbeado, bem penteado, uma tanto pálido e frio, deitado entre as flores em um simplório caixão de madeira!
Meu chão sumiu, devo ter ficada mais pálida que o próprio defunto. Só me restava chorar pelo Beto. Como já estava ao lado dele, cruzei as mãos e aparentei orar. No fundo estava pensando em como sair daquele lugar e avisar minhas amigas que ali não era uma lanchonete e sim um velório!
Depois de "orar" e tentar apaziguar o coração de alguns membros da família, fiz sinal para minhas amigas (para nós 3, um olhar já era um longo diálogo), mudamos nossas aparências de cansadas, para desesperadas e saímos de fininho.
Estávamos no carro, um rapaz se aproximou e perguntou: Vocês conheciam o Beto da "Capitar" ou daqui mesmo. Respondi que isso pouco importava, devíamos só pensar que ele viveu sempre do lado do bem e de coração puro. (não fazia a menor ideia da índole do Beto, esperava estar certa e sumir dali) Fechamos o vidro e partimos, seguidas por todos os olhares.
A dúvida que resiste ao tempo é: Se o Beto já estava morto, posso considerar que um dia o conheci? Nunca imaginei, como é possível, alguém que "quase" conheci, faça parte da minha memória até hoje!
Por que postei essa história real no blog? Simples, os 3 refrigerantes foram de graça!!!!
Ja sou sua fã!
ResponderExcluirMorri de rir, nao como Beto, felizmente.
Uma fã! Ganhei o dia! Escrever as lembranças, é viver e rir novamente. Beijo
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